A asa delta

17/01/2012 14:15

 


    Eu sempre fui louco pra voar, mas sempre disse que de asa delta não serviria (acho que não sou homem suficiente pra correr por aquela rampa), mas esta história não tem nada a ver com este tipo de engenhoca voadora.
    Eu trabalhava de representante comercial e, pelo fato de minha firma ser pequena, e a ajuda de custo que me davam ser menor ainda, eu viajava sempre de carona com um amigo (não um amigo qualquer, mas um amigo que qualquer ser humano pode querer, um dia escrevo sobre ele).
    Pois bem, estávamos em Itabirito. Quando paramos de trabalhar, fomos pro hotel e tomamos banho (separados, lógico!), depois saímos pra tomar “umas”. La pelas tantas da madruga, já bem "enxaguados", resolvemos voltar pro hotel pra dormir (também separados, mais lógico ainda).
    Tava um frio de lascar, e uma serração baixa da “muléstia”.
    Chegamos ao hotel e tocamos a campanhia, o homem atendeu (tinha que descer uma escada cumprida para se abrir a porta). O cara tava parecendo um ninja, todo enrolado em um cobertor, só os olhos de fora. Começamos a subir e meu estômago deu uma roncada que os dois ouviram.

     Olhei pro meu amigo e perguntei: Ta pensando o mesmo que eu? Ele me respondeu apenas com um sorriso. Olhamos pro cara e dissemos em uma só voz: Não vamos entrar agora não! E já viramos as costas descendo as escadas.
    Acho, até hoje, que se aquele sujeito fosse a morte teria nos matado ali mesmo, umas cinco vezes cada um pelo menos (rsss). Tiramos o infeliz da cama naquela friagem toda pra depois resolver não entrar. Deu pra sentir, mesmo já estando de costas pra ele, a sua raiva
    Saímos e começamos a procurar um lugar pra comer. O problema que o único bar que vimos aberto antes de ir pro hotel, era exatamente aquele em que o dono nos expulsara, dizendo que estava muito frio e queria ir dormir.

    Depois que já se está bêbado uma garrafa de cerveja dura uma hora pra ser consumida, não é? E o dono do bar sabia que iríamos ficar ali só jogando conversa fora (tinha que nos expulsar mesmo (rss).
    Passamos pela rodoviária, FECHADA... Passamos na zona boêmia, FECHADA também... Rodamos a cidade toda e nada.
    Até que, ao passarmos por uma esquina, eu avistei uma portinha aberta e disse ao meu amigo: Se não for um boteco é uma igreja de crente fazendo vigília, vamos ver!
    Chegamos, era mesmo um boteco. Tinha três camaradas mortos de bêbados, "escornados" em uma mesa, e uma mulher que (não que eu tenha algo contra), mas se não for sapata, minha mãe é uma bicicleta ou um caminhão cheio de bolas de boliche (pena eu não poder mais contar esta piada em público... ela é ótima!). Mas não era uma sapata como as que encontramos hoje em dia, bonita, cuidadosa, não, esta era daquelas que parecem ser mais macho que um macho mesmo, daquelas que cospem no chão e coçam o “pseudo-saco”.
    Resumindo um pouco a história, perguntei a ela: Minha senhora (respeito, né? Mãe me ensinou isto, e o tamanho do braço e a cara fechada da mulher me incentivaram a ser mais ainda), o que a senhora tem aí pra gente fazer um “mastigo”?
    Ela me olhou com aquela clássica expressão de dono de boteco que já está louco pra fechar e chega um cliente pra encher o saco, mas que sabe que no outro dia tem uma boleta pra pagar e não pode dispensar nada, e me respondeu: “Aí meu! Temos aqui uma asa delta!”
    Olhei pro meu amigo, procurando a resposta para a pergunta que percebi  que ele também estava se fazendo, só pelo jeito dele me olhar: “What the PORRA is this?” (que porra é esta? Pra quem não entende inglês (eheheh))
    Tive que perguntar: Minha senhora (muito educadamente de novo), o que vem a ser uma asa delta?
    Ela de pronto me respondeu com toda “educação” também: “Porra meu, não manjas o que é uma asa delta? É asa de frango, caralho!”
    Não senti muita firmeza no fato de que poderia sair algo que prestasse vindo daquela tão “doce e meiga senhora”, mas a fome tava braba, as lombrigas já estavam se comendo dentro de nossas barrigas. Não me restou outra opção a não ser dizer: Então sapeca quatro na gordura e me dá uma cerveja enquanto frita!
    Enquanto a “mulher” fritava as asas delta aconteceu outra coisa engraçada, mas por não ter nada a ver com o caso, a não ser pelo fato de ter ocorrido no mesmo lugar, vou deixar pra contar em outra ocasião.
    Pois bem, tomamos a cerveja, e pra meu espanto, nunca vi uma asa de frango (ou delta, como preferirem), fritar tão rápido. Mas bêbados e famintos não percebem estes detalhes de imediato.

    A asa delta veio pingando sangue ainda, parecia ter sido arrancada com as próprias mãos do corpo do pobre galináceo. Tava tão ruim que só mesmo a fome pra me fazer comer aquilo. (A fome e o outro fato que ocorrera naquele bem-dito local).
Depois disto, nunca mais voltei a Itabirito. Não por medo de lá só ter asa delta pra comer, mas por falta de oportunidade mesmo.
   Com certeza, foi uma das minhas passagens mais loucas de minha vida de representante.

 

    Resumindo... Quando alguém lhe oferecer uma asa delta, saia voando!